segunda-feira, outubro 27, 2014

Retórica da nova forma de ser um eleitor


Acompanho um amadurecimento de uma população em que achava que não iria viver para isso. E quem diria em meus plenos 30 anos estou acompanhando esta evolução.
Desde meus estudos em História e Geo-Política que escuto que a população foi às ruas buscar as Diretas já, que muitos foram exilados pela ditadura por se expressar e ir contra este governo.
Nasci em 1982, onde o então presidente João Figueiredo ainda dava o “golpe” atrasando a negociação com o FMI para que não atrapalhasse as eleições governamentais.
E logo em 1983 começou o movimento das diretas Já. Temos enraizados que este foi um movimento de grande orgulho. Quebrando com uma Era de Militares eleitos pelo colégio eleitoral e dando inicio ao voto direto.
Desde então com a Constituição promulgada (1988) o Brasil tem vivido uma onda inerte e quase alheio à política. Onde discutir política era quase proibido e que se você começasse a discutir iria levar aquele suave tapa na boca de sua mãe ou olhares recriminando com o chavão: “Política e Religião não se discutem”.
Então, era assim passamos de Tancredo a Sarney e elegemos Collor. Começamos aí a quebrar um pouco dessa inércia de opinião política. Em meios a denúncias de corrupção envolvendo o ex-tesoureiro PC Farias. Umas grandes massas de jovens foram à rua, chamavam de “Os Cara Pintadas”. O que cumulou em o então presidente Collor renunciasse e posteriormente fosse julgado com a impugnação de seu mandato político, o impeachman, colocando seus direitos políticos cassados pelos próximos oito anos.
Uma luz foi dada a população brasileira. “Nos ainda temos voz”, e como, em minha opinião o processo aberto do impeachman só foi consolidado (leia-se votado no congresso) graças à pressão popular, já que o presidente já havia renunciado.
Desde o movimento dos “Caras Pintadas” a população voltou a uma inércia, a meu ver a de um período maior. Mesmo quando trocamos o governo de Direita para Esquerda, não tivemos nenhuma sobra de movimento que configurasse um pedido da população neste quesito. Mesmo assim houve esta troca de partidos e de ideais.
Até que em 2013 esta inércia foi quebrada. Começou com um movimento estudantil nas principais capitais que era contra o aumento nas passagens de ônibus. Este movimento começou a tomar adeptos pelo Brasil e pelo mundo. Tendo grande visibilidade e consequentemente tendo novos adeptos após a forte repressão policial acontecida em São Paulo.  Passando de um movimento com uma causa única (o aumento das passagens de ônibus) para um movimento de extrema insatisfação com a violência policial, gastos públicos do governo com eventos esportivos (Copa das Confederações e Copa do Mundo), insatisfação com os serviços públicos, e com a corrupção. Este movimento ficou conhecido pelo Brasil e pelo Mundo como “Não é apenas pelos 20 centavos” (os vinte centavos era o valor que aumentou nas passagens de ônibus) ou “Manifestações de Julho”.  O que rendeu algumas medidas paliativas do governo chamado “Agenda Positiva” em que propôs para amenizar as manifestações como: Tornar a corrupção como um crime hediondo, arquivar a PEC 37 (A PEC que definiria como competência "privativa" da polícia as investigações criminais), proibir o voto secreto aos políticos cassados por meio a irregularidade e revogação dos preços das passagens de ônibus em várias cidades brasileiras.
Uma visão bem pessoal em conjunto com o momento político e governamental diria que a população estava sedenta por uma mudança brusca de realidade.  Com toda esta insatisfação que beirou a um quase boicote (quase boicote, pois houve muitos que viraram as costas e que mesmo tendo o futebol como uma grande paixão queria a justiça e não o descomunal investimento de infraestrutura em obras quem em alguns locais serão des-utilizadas gerando um elefante branco e não um promissor investimento) a uma das paixões nacionais (A Copa do Mundo) escândalos relacionados à política como o “Mensalão”, Queda de ministros numericamente expressiva, “CPI da Petrobras”,  Governo ‘explicitamente’ dando ordens e influenciando a taxa da inflação e o pior tendo o PIB decaindo progressivamente.  Todos estes fatores eram visíveis de que algo deveria ser feito.
Não entrarei no mérito de que a população brasileira avançou e deixou a faixa da pobreza. Pois não acredito que mascarar a posse do cidadão seja um real fato de evolução. O poder de compra aumentou, o IPI de eletrodomésticos e carros abaixou a zero o que induz o consumismo, que aumenta a produção, gera empregos, movimentou a econômica positivamente (mesmo com o governo mascarando, não tão mascarado, a taxa de inflação), mas sem um real ganho destes e quando o IPI começou a voltar os empregos começaram a se esvair, o poder de compra cair e a inflação... sem palavras.
Voltando a inércia quebrada, a busca sedenta da população por respostas e mudanças positivas do governo para com a população, deu inicio em 2014 uma caminhada eleitoral a presidência da republica.
Entenda a visão geral das eleições por um lado pessoal. Tínhamos três candidatos possíveis: Dilma candidata a reeleição (teoricamente do partido de esquerda); Aécio Neves (do partido de direita) e Eduardo Campos um político jovem e promissor que com sua vice Marina Silva era o fator em que poderia dar uma chance a Aécio a disputar o segundo turno.
Dilma Roussef uma ex-ministra da Casa Civil, presa política e sucessora de Lula. Uma presidente pouco carismática, pouco inteligente, que em minha opinião ganhou “na loteria” por estar na hora certa e no local certo. Em uma reunião da cúpula do PT deviam estar pensando, quem podemos colocar para substituir Lula? Ninguém tem o carisma, a lábia, a voz rouca o dedinho a menos e a vivencia sindical que ele tem. Ai alguém apontou e se pegarmos alguém que tenha uma vivencia chocante e que causa impacto? Eis que Dilma grita: Eu já fui presa política!!! Pronto, a única que tinha algo vivenciado a concorrer com o venerado Lula. Dilma o “Coração Valente”.
Aécio Neves, neto do primeiro presidente e quase um mártir (por ter morrido antes de tomar posse) eleito depois de uma era da ditadura militar. Um político nato (como Lula), lábia, carisma e acima de tudo muito bem preparado. Com uma vantagem e uma desvantagem: ser de Minas Gerais o segundo Colégio Eleitoral em que da uma grande visibilidade perante o próprio Colégio e ao Brasil, porém pode derruba-lo (como aconteceu nestas eleições).
Eduardo Campos, como Aécio e Lula um político nato. Carismático, neto de governador, incrivelmente inteligente e inovador não tinham chances de se eleger nestas eleições, mas com certeza tendo uma boa orientação seria um grande nome para daqui duas eleições, talvez. Com apoio de Marina Silva (a zebra das eleições de 2010 que levou as eleições serem decididas no segundo turno entre Serra e Dilma). Eduardo tinha chances de crescer, porém um acidente em meio à corrida eleitoral retirou-lhe a vida e seu futuro promissor. Dando a Marina a chance de buscar mais uma vez ser a zebra.
Marina Silva, seringueira, analfabeta com uma história de vida um tanto espetacular envolvendo miséria, trabalho e superação. Não é tão carismática, não tem aparência que agrade e tem uma posição firme quase que limitada e radical. Mas sem dúvida uma figura que sabe o que quer. Inteligente e com posição consistente e sólida quanto aos seus ideais. Assumiu o lugar de Campos para concorrer à presidência do Brasil. O que segurou a frente de Dilma e Aécio durante quase toda campanha, mas acabou sendo aquela que mais uma vez foi a responsável pela decisão em segundo turno. Acredito que Marina teve seu público, já cativo desde as eleições de 2010, aumentado devido a grande comoção nacional como causa à morte prematura de um grande político e pai de família. De alguma forma ela não conseguir fidelizar este público que migrou para Aécio.
Em meio a três polos políticos que deteriam os olhos voltados em uma eleição, a inércia da população foi novamente quebrada. Talvez por causa de ideais, ou a busca por mudanças ou simplesmente inércia das redes sociais. Começou pela primeira vez a “liberdade política” a toda população. O discurso político, o posicionamento, a defesas de ideias ou ideais mesmo que cegos eram visíveis nas redes sociais, nas discussões dos grupos de whatsapp, na mesa de um bar ou nas reuniões de família. Resultando em até brigas.
Mas de uma forma geral, vejo esta “liberdade política” como uma vertente boa da população, antes era quase que proibido falar, pois recebíamos olharem fuziladores, pessoas falavam “Política e Religião não se discute” e passávamos a ser politicamente imitadores do que liamos ou escutávamos.
Esta liberdade e facilidade que estamos temos graças às redes sociais vêm dado a sensação de liberdade as pessoas em que (por qualquer que seja o motivo, sem entrar em méritos sociológicos da questão) estão opinando, demonstrando e defendendo suas posições. A réplica de reportagens, charges e memes ( um conceito, foto, vídeo, pessoa ou fato que se populariza rapidamente pela rede). As discussões acaloradas, os posicionamentos por partidos, ideais vêm mostrando uma população que é sim, politicamente ativa.
Acredito que temos muito que crescer e amadurecer em meios a opiniões políticas e econômicas. Não acho que estamos maduros o suficiente para discutir, pois ainda vivemos em um mundo quem que o meio influencia as opiniões e, generalizando, não buscamos estudar e entender a fundo cada matéria. A imprensa influencia, as notícias (muitas delas falsas) são replicadas palavras por palavras como verdades absolutas. Este fato, de acreditar e replicar a noticia sem verificar a veracidade, é algo que temos muito que trabalhar e não apenas nos meios de assuntos políticos, mas de tudo.
Porém fiquei incrivelmente feliz por ter visto esta abertura acontecer. Ter uma população voltada para o debate nas emissoras de TV, ver as discussões deste debate até mesmo os memes que surgiam destes, é algo extremamente prazeroso. A busca por resposta as postagens que os amigos faziam contra seu candidato o orgulho dos eleitores em colar o adesivo em carros e em blusas é sensacional. E o melhor se configurou na espera dos resultados onde o primeiro número divulgado era de um empate técnico com menos de 1% de diferença dos candidatos. Começou a chover vivas e reclamações.
E o resultado veio como uma final da Copa do Mundo, vivas e até foguetes foram escutados em comemoração enquanto outros vaiavam, e demonstravam sua insatisfação em meio a vídeos, fotos, memes e textos.  A satisfação ou insatisfação com o resultados destas eleições foram puramente por uma insatisfação/satisfação de ideologias e propostas políticas, mas no modo de amadurecimento em debates ganhou total destaque. Mostrou para os candidatos que se eles forem espertos comecem suas estratégias de campanha voltadas para a população, para as redes sociais e não para seus partidos ou para públicos definidos. A rede social hoje igualou a população. E através dela é possível agregar pontos a estratégias em que envolve verdadeiramente os eleitores.
É um pouco contraditório o que estou sentindo e qual seria o resultado das eleições para mim. Estou feliz sim, com o amadurecimento da população em relação ao debate político, a abertura das discussões, porém, talvez pela falta de compreensão global, de visão gerencial e pelas muitas repetições como marionetes causadas pela influencia da mídia (verdadeiras e falsas) vimos uma população extremamente separatista, pre-conceituosa, injusta e um tanto cega.
Como foi dito acima, os resultados das eleições 2014 deixou muitos satisfeitos e muitos insatisfeitos. É claro, a população esta tecnicamente empatada. 50% feliz e outros 50% infeliz com o resultado. Não devemos nem podemos falar que uma destas metades está errada ou certa. Definitivamente a realidade de todo país não é única. Temos variações não apenas geográficas, mas, climáticas e sociais. Temos três vertentes de lideres (prefeitura, governamental e presidência) em quase todas as regiões em que dentro de cada partido temos políticos bons e políticos ruins, temos ainda o coronelismo embutido e isso não significa que uma região ou grupo de pessoas sejam mais pobres, mais burros ou mais inteligentes, significa que em cada região existem pessoas querendo viver e outras procurando sobreviver e que para isso elas se agarram aos ideais (diferentes, errados ou certos) que lhe pareçam ser mais assertivos que lhe permitam VIVER melhor e não apenas a SOBREVIVER às intempéries existentes.

Enfim fechamos um ciclo desta corrida eleitoral em que deixou um legado de amadurecimento mesmo que parcial da população para política. Que este amadurecimento tenha uma curva exponencial e que venha com consistência, profundidade e muito conhecimento para que eu possa viver em um país que não é perfeito, mas que está fazendo o possível para ser e assim para que meus filhos e netos possam continuar este legado, em busca do viver melhor e da justiça. Em que a população tem voz e vez e que possamos acreditar que a discussão é necessária e bem vinda. Discutir é divagar ideias, é apresenta-las, dar consistência e muitas vezes mudar nosso pensamento. Não é ser vira-folha é simplesmente ser maduro o suficiente para aceitar e entender o outro, o diferente.