Once upon a time...
Deste de 1997 (mais ou menos) comecei a frequentar um asilo chamado Asilo Cantinho da Paz no bairro São Benedito (não sei falar se é Santa Luzia ou BH), mas como uma boa mineira: "é logo ali".
Conhecemos este asilo através de uma indicação de local para doação das inúmeras doações que havíamos arrecadado na I Gincana do GJeSCLa. Conhecemos e por algum motivo foi "determinado" que iríamos adotar este asilo. Não sei falar ao certo em relação a datas e acontecimentos, mas vou tentar resumir.
O início
O asilo tinha duas casas e a Dona Tânia recebia todos desde velhinhos a pessoas mais jovens com doenças mentais, o negocio dela era acolher com muito amor todos que pedissem. Mas, claro tentando da melhor forma, era muito velhinhos, muita comida, muita roupa de cama... e muito pouco dinheiro. Eram duas casas pequenas sem nenhuma adaptação, era separada pela casa das mulheres (descendo o morro a esquerda, ah a rua era de terra) e em cima era a casa dos homens e dos mais jovens (com problemas mentais). A comida era feita na casa de cima e um dos velhinhos descia o morro com o carrinho de mão levando a comida e as roupas eram lavadas na casa de baixo.
Estruturalmente falando, as casas não eram adaptadas, estava infestada de sarna (sarna mesmo, tínhamos que chegar em casa tirar a roupa, tomar banho e colocar as roupas p lavar separadamente pois como sabem, sarna "pega"). o cheiro de xixi "doía", e as condições também, mas o que mais impactava eram 2 coisas: O amor, cuidado e empenho da Dona Tania e a alegria dos velhinhos quando os jovens chegavam. Ah era lindo, não dá para explicar...
Doações e Profissionais da saúde
Passado algum tempo implementamos um "Dizimo" de alimentos, nada mais era que carnês, todos pegavam um carnê e o pagamento era mensal e era: 1 pacote fraldas/ leite/ desinfetante/ arroz/feijão... e assim ia, todos os meses recebíamos muitos "dízimos" e tínhamos certeza que estávamos fazendo a diferença. Lançamos também o convite aos profissionais da saúde para fazer visitas regulares, conseguimos vários que foram (o inicio bem assíduos) mas permaneceram por mais tempo apenas 2 era a Dra Mirian ( se não me engano o nome era esse mesmo) e o Cássio (jovem recém formado do grupo mesmo). Nessas altura Dona Tania ja confiava e se arriscava em pedirmos para ajudar a pagar a conta de água, luz e como tarefa dada era tarefa cumprida, sempre buscávamos o atender o máximo que podíamos.
A mudança
Em alguma eleição uma vereadora (não lembro o nome) conseguiu doar um terreno para construção de um novo asilo (com estrutura, tamanho e adaptado) para ser a nova sede do Asilo Cantinho da Paz. E não é que a obra foi praticamente finalizada? Mas por algum motivo que prefiro não especular a Dona Tania e os velhinhos não podiam "subir" ( esta casa era no mesmo bairro porem na parte mais alta dele). Então buscamos advogados, pessoas que entendiam e conseguimos (claro tivemos ajudas de vários parceiros) o terreno fosse realmente do Asilo Cantinho da Paz. Mas ai faltava terminar o telhado, colocar anti derrapante e corrimão nas rampas, faltava isso aqui, isso ali... coisas de obra... Novamente a Gincana do GJeSCLA que tinha mudado o nome para Gincana Paz e Bem foi toda destinada ao asilo, foi conseguido caminhão de brita, tijolos, cimentos, telhados, chuveiros elétricos, entre varias outras doações de praxe (comida, roupa, roupa de cama, material de limpeza, higiene) camas, cômodas, mesas. E finalmente os velhinhos mudaram, o mais jovens com doenças metais não puderam continuar, pois era uma determinação, asilo era apenas para idosos. Neste meio tempo Dona Tânia muito doente faleceu, o que apertou bem nosso coração, pois ela era o coração daquele lugar. E como prometemos não largamos mais. Neste tempo a Micheline e a Patricia que ajudavam a dona Tania antes tomaram a frente e como ela, sempre que precisava corria p nosso encontro quando necessário.
O dia a dia quinzenal
As visitas ao asilo eram feitas todo os domingos, marcado na pracinha da Igreja as 9h ficava até umas 10h-11h. Esta visita passou a ser quinzenal. Muitos laços de carinho, respeito e admiração foram criados. Eles sabem que nos vamos e nos cobram quando nós não vamos.
Chegou ao ponto deles pedirem para ir até um cemitério receber o caixão de uma velhinha querida, pois alguém tinha que assinar os papeis e a velhinha não tinha ninguém que fizesse isso. Ficaram lá Luana, André e Mateus com a Santinha. Tenho certeza que a santinha tava dando aquela risadinha que só ela dava lá no céu para eles. e essa relação é até hoje Janeiro de 2016. com visitas quinzenais, arrecadações na Gincana, no dia a dia, tentando ajudar com outras coisas mais pontuais...
Eu e eles
Confesso que mesmo estando envolvida na organização, nas arrecadações, na divulgação de todos os acontecimentos eu me tornei bem inconstante nas visitas. Não é fácil ir sempre, não é fácil ver os velhinhos chorando de saudade da família, mostrando fotos de 7 filhos, 10 netos, e não ter a visita de nenhum deles. é difícil ver aquele velhinho com frio pedir cobertor e ver a moça que trabalha lá falar: "não, to com calor, depois eu dou cobertor para ele". Não é fácil... Então sempre tenho uma desculpa na ponta da língua... não acordei a tempo, tenho um almoço na casa da minha avó, tenho um churrasco, dormi muito tarde... as desculpas são inúmeras e estão sempre prontas para serem dadas.
Mas, falo com toda certeza do mundo, toda vez que eu venço essas desculpas, preguiças eu sinto uma força... é bem mágico!
Hoje
E hoje, eu venci essa preguiça, depois de uns 2 meses eu fui ao asilo e o nó na garganta se transformou em tapa na cara. Sabe aquelas historias bem clichês que a gente recebe de corrente? Pois é... eu presenciei em uma manhã duas que deixaram bem pensativa.
Clichê 1
Estávamos sentados no quarto de 3 velhinhas, uma estava deitada (Dona Chica, a mais mal humorada de todos, mas adora ser adulada), a Nelcina (pensa numa pequenina, lúcida, boa, e fofa, pois é nem chega aos pés da Nelcina) e da Maria (ela já tem 100 anos, uma fofa, mas fica na cadeira de rodas na "salinha" para pegar o sol). Estávamos nos ( 5 pessoas) e os espíritas ( um grupo que como a gente visita e ajuda muito o asilo desde muitos anos).
A Nelcina adora que a gente leia o Evangelho do dia para ela, então sempre fazemos esse momento de oração lá no quarto e nessa hora chega a Dona Esqueci o nome (ops), ela chega com um vestido na mão e entrega para a senhora do grupo dos espíritas e fala: " Para você, vai ficar lindo em você".
Ela tinha acabado de ganhar no Natal esse vestido, estava novinho e era lindinho mesmo, e ela achou que a senhora X iria gostar e deu para ela. Uma atitude tão simples, tão linda, tão tocante que fiquei sem palavras. (Só para explicar, todos os velhinhos guardam as roupas e coisinhas que ganham em sacolas plásticas enfiadas ao lado da cama ou em baixo do travesseiro, primeiro porque são poucas coisas segundo por quer não tem outro lugar para guardar. ai vem o clichê: "ela já tem muito pouco e mesmo assim pegou o pouco que tinha em melhor estado e deu para o outro simplesmente para fazer um ato de carinho".
Clichê 2
Quando chegamos seu Onofre estava com o braço direito parado sempre ao peito, e ao perguntamos o que era ele falou que tinha machucado o ombro e assim doía menos, não era nada demais achava que tinha dormido de mal jeito. Eis que nosso engenheiro de plantão depois de um tempo, pegar um lençol e fazer uma tipoia e coloca no seu Onofre:
E a reação dele foi se emocionar, ficou um tempo enxugando os olhos lacrimejados.
E ai eu fiquei olhando e curtindo esses momentos em que eu pensei: ainda tem sim, pessoas boas, pessoas simples de coração, que querem dar sem precisar receber, que querem dar o seu melhor.
Final
E de maneira totalmente livre, sem muito cuidado com métricas, execução de texto eu resolvi deixar registrado um pouco do amor que eu vi e recebi hoje. Dos abraços apertados, dos "muito obrigada(o)", do escutar "que Deus sempre acompanhe vocês, vocês são muito importante para a gente"...
Esse é uma das salinhas que muitos tomam um solzinho e veem uma tv.
Como seu José falou comigo hoje: " Que Deu te livre da maldade, que te leve com a segurança com que te trouxe e que você siga seu caminho com sol, chuva e vento, por que, sabe menina, tem que vento para espalhar as sementes da lavoura, tem que ter chuva para fazer crescer e tem que ter sol para dar o doce dos frutos, então que você siga com os três bem igual sem nenhum ser mais do que o outro" ...
Para todos nós: Sol, Chuva e Vento!!!